terça-feira, 1 de julho de 2008

INDICAÇÃO DO MÊS: LIVRO:



Nota do Autor à 4a Edição
Finalmente, por ocasião do lançamento da 4a edição desta obra, decidimos fazer uma nova nota. sem excluir a nota original. A manutenção da nota anterior se deve ao fato de seu conteúdo permanecer atual e necessário. Este trabalho, embora tenha ganho alguma robustez, mantém a estrutura e filosofia originais de tentar retratar um conjunto de reflexões sobre temas relativos aos juizados especiais, consubstanciado na doutrina e jurisprudência fluentes. Neste sentido, importante ressaltar que novas obras foram consultadas e novas decisões foram colacionadas, destacando as orientações dominantes que surgiram a partir das últimas edições.
Outrossim, inserimos algumas informações que agora nos pareceram pertinentes ao estudo do instituto, tais como os projetos de lei em tramitação visando alterar o texto da Lei ï\o. 9.099/95, observações sobre os modelos estrangeiros de juizados especiais, dados estatísticos sobre o desempenho dos juizados especiais no Brasil etc. As inclusões mais significativas, entretanto, foram aquelas relacionadas ao advento dos juizados especiais federais (Lei n2 10.259/01). Algumas passagens comparativas foram inseridas ao longo do trabalho e foi mantido, sob a forma de anexo, o texto de nossa autoria que faz uma análise geral da Lei dos Juizados Especiais Federais.
Feitas estas considerações, gostaríamos de aproveitar esta nota para registrar a nossa preocupação com a situação dos juizados especiais no Brasil.
Se por um lado a realidade forense sempre vai apresentar uma série de episódios de desvio de finalidade no exercício da atividade jurisdicional (aspecto inerente a nossa condição humana de falibilidade), por outro lado, é preciso reconhecer que estas situações se avolumam de uma forma impressionante e sistemática nos juizados especiais. Pior, estas distorções, algumas vezes, estão plenamente incorporadas ao cotidiano dos órgãos judiciais, como se fossem uma coisa absolutamente normal ou mesmo uma fatalidade do destino.
Com efeito, a malha principiológica, a irrecorribilidade das decisões interlocutórias, a dispensa da presença do advogado, a exigência de custas para recorrer, a inexistência de ação rescisória, dentre outras características fundamentais dos juizados, têm sido usadas para distorcer o instituto.
Em nossa visão, este problema tem quatro vetores principais: a elevada e crescente demanda pêlos serviços judiciais; a limitada estrutura material e humana disponível; a falta de uma postura instrumental legítima dos operadores do Direito; e a falta de um controle mais rígido sobre o que é feito nestes órgãos.
Pouco tem se falado a respeito, mas é inegável que os reflexos desta crise têm sido cada vez mais significativos. Muito advogados olham com desprezo para os juizados especiais, preferindo trabalhar nas varas cíveis, mesmo quando podem lançar mão do procedimento especial. Alguns julgadores, aproveitando-se da liberdade proporcio- nada pela Lei. implementam posturas irreais, ilegais e, mesmo, autoritárias. Diversas partes, especialmente as mais simplórias, são frustradas na sua expectativas de verem seus direitos adequadamente tutelados. As causas nos juizados têm durado tanto ou mais tempo que as causas na chamada justiça ordinária.
É preciso com urgência reconhecer a importância e os riscos que esta crise geram para o Poder Judiciário e para a sociedade de um modo geral.
Os juizados especiais, cujo início de funcionamento se deu em 1996, já respondem atualmente por, no mínimo, a metade do total de processos na área cível que tramitam na justiça de diversos Estados.
No Rio Grande do Norte e no Amapá, por exemplo, a participação dos juizados especiais já representa cerca de 70% dos processos propostos na área cível. Os juizados especiais federais, que se utilizam subsidiariamente do sistema criado pela Lei na 9.099/95, seguem o mesmo caminho. Com isso, é possível afirmar que os juizados especiais estão deixando de ser uma exceção para se tornarem a regra em nosso sistema judiciário.
É preciso, portanto, reconhecer que os juizados especiais não foram concebidos para assumirem o papel de "salvadores da pátria" do sistema processual. Muito pelo contrário, a sua legitimidade, como um procedimento especial, repousa justamente na excepcionalidade das questões a eles sujeitas. A sua existência se vincula às chamadas demandas reprimidas (litigiosidade contida), ou seja, causas que normalmente não seriam levadas à apreciação do Poder Judiciário, em razão da sua pequena repercussão ou reduzido valor econômico.
Tranformá-los em procedimentos ordinários, embora tentador como solução emergencial, pode levá-los a um caminho de deteriorização sem volta, como ocorreu com o então chamado "procedimento sumaríssimo" do CPC.
Destarte, se todos os envolvidos na aplicação dos juizados especiais não assumirem uma postura adequada à sua importância, dentro de muito pouco tempo nós estaremos mais uma vez tendo que pensar em novas formas para substituir este instituto, já então corroído e inapto para atingir suas funções precípuas.
Por isso, mesmo atentos a toda problemática que envolve a vivência prática do instituto, reafirmamos nosso compromisso com a visão técnica dos juizados especiais. De fato, se a realidade muitas vezes se afasta da teoria, acreditamos que só com uma base teórica sólida e coerente poderemos construir uma nova realidade, comprometida, acima de tudo, com os ideais da Justiça e da paz social.
Rio de Janeiro, março de 2005.
Felippe Borring Rocha

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